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terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Pesquisadores buscam retirar 'combustível' de célula cancerosa para tratar tumor

Na última década, desenvolvedores de drogas contra o câncer tentaram conter os aceleradores que causam o crescimento de tumores. Agora eles querem bloquear o fluxo de combustível.


As células cancerosas, devido ao seu rápido crescimento, têm um apetite voraz por glicose, o principal nutriente usado para gerar energia. E os tumores muitas vezes usam a glicose de forma diferente das células saudáveis, uma observação feita pela primeira vez por um bioquímico alemão na década de 1920.


Essa observação já é usada para detectar tumores no corpo usando tomografias por emissão de pósitrons. Uma forma radioativa da glicose é injetada na corrente sanguínea e se acumula em tumores, iluminando a imagem do exame.


Agora, os esforços estão se direcionando para diagnósticos para tratar a doença ao perturbar o metabolismo especial das células cancerosas, privando-as de energia.


A principal estratégia de pesquisa da última década envolveu as chamadas terapias direcionadas, que interferem em sinais genéticos que agem como aceleradores, causando o crescimento dos tumores. Mas existe uma tendência a haver aceleradores redundantes, então bloquear apenas um com uma droga geralmente não é suficiente.


No entanto, pelo menos na teoria, privar os tumores de energia deve fazer com que todos os aceleradores percam eficácia.


"Os aceleradores ainda precisam da fonte de combustível", disse Chi Dang, professor de medicina e oncologia da Johns Hopkins University. De fato, afirmou Dang, descobertas recentes mostram que os sinais de crescimento genético muitas vezes trabalham influenciando o metabolismo das células cancerosas.


Os esforços para explorar o gosto por doces do câncer ainda estão engatinhando, com poucas drogas em testes clínicos. Mas o interesse está crescendo entre as empresas farmacêuticas e pesquisadores acadêmicos.


"O fornecimento e a privação de nutrientes está se tornando a próxima grande onda'', afirmou David Schenkein, CEO da Agios Pharmaceuticals, uma empresa formada há dois anos para desenvolver drogas que interferem no metabolismo do tumor. Entre seus fundadores está Craig B. Thompson, novo presidente do Memorial Sloan-Kettering Cancer Center de Nova York.


Outras empresas menores, como a Cornerstone Pharmaceuticals e a Myrexis, estão buscando essa abordagem, e grandes empresas farmacêuticas também estão seguindo esse caminho. Este ano, a AstraZeneca concordou em trabalhar com a Cancer Research UK, uma organização beneficente britânica, no desenvolvimento de drogas que interferem no metabolismo do câncer.


Um fator que gera interesse no metabolismo do câncer é a intrigante interação entre o câncer e o diabetes, uma doença metabólica marcada por altos níveis de glicose no sangue. A possível ligação entre os dois grandes males atrai tanta atenção que a Sociedade Americana do Câncer e a Associação Americana do Diabetes publicaram em conjunto uma declaração consensual este verão resumindo tal evidência.


Pessoas com diabetes tipo 2 tendem a ter risco maior de desenvolver certos tipos de câncer. E evidências preliminares sugerem que a metformina, a pílula mais usada contra diabetes, possa ser eficaz no tratamento ou prevenção do câncer.


Ainda não está claro se um alto nível de glicose no sangue é a razão pela qual os diabéticos possuem maior risco de desenvolver câncer. Uma explicação mais provável é que pessoas com diabetes tipo 2 possuem níveis mais altos de insulina, um hormônio conhecido por promover o crescimento de certos tumores, de acordo com a declaração consensual mencionada anteriormente.


De forma similar, a metformina pode combater o câncer a reduzir os níveis de insulina, não de açúcar no sangue. Mas há algumas evidências de que a droga trabalhe em parte inibindo o metabolismo da glicose em células cancerosas.


Mesmo que o nível de açúcar no sangue alimente o crescimento de tumores, especialistas afirmam que tentar diminuir o nível geral de açúcar no corpo ?


passando fome, por exemplo ? provavelmente não seria eficaz. Isso porque, pelo menos para pessoas sem diabetes, o corpo é muito bom em manter certo nível de açúcar no sangue, apesar das flutuações na dieta.


"Quando um paciente com câncer sofre restrição de calorias, a quantidade de glicose no sangue até que ele esteja quase morto é próxima do normal", disse Michael Pollak, professor de medicina e oncologia da McGill University, em Montreal. Além disso, afirmou Pollak, os tumores são especialistas em extrair glicose do sangue. Então, mesmo que a glicose seja escassa, "a última célula sobrevivente no corpo seria a célula do tumor", ele disse.


Assim, os esforços estão direcionados não apenas para a redução do nível geral de glicose no corpo, mas para a interferência específica em como os tumores usam a glicose.


Isso leva ao efeito Warbug, que leva esse nome em homenagem a Otto Warburg, o bioquímico e vencedor do Nobel alemão que notou pela primeira vez o metabolismo particular dos tumores, na década de 1920.


A maioria das células saudáveis queima primariamente glicose na presença de oxigênio para gerar ATP, um químico que serve como fonte de energia da célula. Entretanto, quando o oxigênio está baixo, a glicose pode ser transformada em energia por outro processo, chamado glicólise, que produz ácido lático como resultado. Os músculos que realizam exercícios extenuantes usam a glicólise, com o acúmulo resultante de ácido lático.


O que Warburg observou foi que os tumores tinham tendência a usar glicólise mesmo com a presença de oxigênio. Isso é intrigante, pois a glicólise é muito menos eficiente que a produção de ATP.


Uma teoria é que as células cancerosas precisam de matéria-prima para criar novas células com a mesma intensidade com que precisam de ATP. E a glicólise pode ajudar a fornecer esses elementos.


"É possível economizar a energia que acende as luzes da sua casa, mas aquela energia não é capaz de criar nada", disse Matthew G. Vander Heiden, professor assistente de biologia do Massachusetts Institute of Technology.


Todavia, assim como tudo que diz respeito ao câncer, o metabolismo é algo complexo. Nem todas as células cancerosas usam a glicólise, e algumas células normais o fazem. Então pode ser um desafio desenvolver drogas capazes de prejudicar tumores, mas não células normais.


Dois esforços anteriores realizados por uma empresa chamada Threshold Pharmaceuticals para interferir no metabolismo da glicose não deram certo em testes clínicos. Uma das drogas da Treshold, a 2DG, é a mesma forma de glicose usada nas imagens de tomografia por emissão de pósitrons, mas sem a radioatividade. Devido a uma leve modificação química, essa forma de glicose não pode ser metabolizada por células, então ela se acumula.


Um acúmulo muito menor de 2DG é necessário para detectar um tumor num exame do que destruí-lo. Grandes quantidades da droga foram necessárias porque ela só dura um período muito curto no corpo e teve de competir com a glicose natural que é abundante na corrente sanguínea.


No entanto, os esforços não terminaram. Waldemar Priebe, professor de química medicinal do M.D. Anderson Cancer Center, afirmou ter desenvolvido uma forma de entregar quase dez vezes mais 2DG a um tumor. Ela foi licenciada para uma empresa nova chamada Intertech Bio.


A outra droga da Treshold, a glucosfamida, consistiu em glicose associada a um agente quimioterápico padrão. A ideia era que, como o cavalo de Troia, os tumores ingeririam a glicose e seriam envenenados.


Num teste clínico na última fase envolvendo mais de 300 pacientes com câncer pancreático avançado, a glufosfamida prolongou vidas em comparação à ausência de tratamento, mas sem expressão estatística.


Uma nova empresa, a Eleison Pharmaceuticals, planeja repetir o teste. Forrest Anthony, diretor médico da Eleison, afirmou que o teste original teria tido sucesso se excluísse 43 diabéticos que tomavam insulina, pois, como se sabe, ela impede a detecção de tumores por exames de tomografia de emissão de pósitrons. A insulina ''envia glicose para o músculo esquelético e para o tecido adiposo, não para o câncer'', disse ele.


Muitas outras empresas e cientistas estão tentando desenvolver drogas que inibem enzimas ?pyruvate kinase M2, por exemplo, envolvido no metabolismo de tumores.


Outra abordagem é não privar um tumor de energia, mas dar a ele ainda mais energia. Essa é a ideia por trás de uma substância chamada dicloroacetato, ou DCA. Evangelos Michelakis, da Universidade de Alberta, pai da ideia, diz que há um mecanismo pelo qual células que se tornam defeituosas podem cometer suicídio para o bem maior do corpo.


Porém, células cancerosas geralmente não se matam. Segundo Michelakis, isso pode ocorrer por falta de energia suficiente.


O DCA, um químico simples formado em pequenas quantidades quando a água potável é clorada, há muito tempo tem sido usado para tratar certas doenças raras nas quais o ácido lático se acumula no corpo. O DCA inibe uma enzima chamada PDK (pyruvate dehydrogenase kinase). O efeito dessa inibição é mover o metabolismo para longe da glicólise que produz ácido lático e em direção a uma oxidação mais normal da glicose na mitocôndria, as fábricas de energia da célula.


Em 2007, Michelakis e colegas publicaram um artigo mostrando que o DCA, quando colocada em água potável, poderia desacelerar o crescimento de tumores em pulmões humanos implantados em ratos. Aparentemente, o DCA não afetou as células normais.


Alguns pacientes começaram a pedir isso. Em alguns dias, um químico amador tinha sintetizado o DCA e começou a vendê-lo. Algumas clínicas ainda oferecem. Michelakis alertou que, em altas doses, o DCA pode causar danos nervosas e que são necessários meses para que uma quantidade suficiente se acumule no corpo para causar qualquer efeito.


Nesta primavera, no jornal "Science Translational Medicine", Michelakis relatou resultados do primeiro teste humano do DCA, em cinco pacientes com glioblastoma multiforme, um câncer cerebral mortal. Não havia grupo de controle, o que dificultou julgar a eficácia da droga, embora alguns pacientes tenham vivido mais do que o esperado. Houve evidências de que a droga reforçava a atividade da mitocôndria e promovia o suicídio de células.


Como o DCA não é um composto novo, não pode ser patenteado. Portanto, é improvável que uma empresa farmacêutica pague para realizar testes clínicos com ele. Sendo assim, Michelakis tem levantado recursos de fundações e governos para conduzir testes clínicos mais amplos.


"Só temos suposições e empolgação teórica", disse Michelakis. Mesmo assim, ele acrescentou, "não há dúvida de que esta é uma nova direção muito atraente e lógica".

DO "THE NEW YORK TIMES*

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