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quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Artigos sobre namoro e relacionamento.

O difícil convívio com a família do outro


Não é muito difícil perceber que a convivência com outros seres humanos é uma das tarefas mais difíceis que temos, embora sejamos permanentemente colocados diante dela durante toda nossa vida. Conviver é um constante exercício de flexibilidade e relativização. Isso porque não podemos fazer o que desejamos na hora em que bem entendemos como se fossemos totalmente independente dos outros. Justamente por causa desses outros, muitas vezes precisamos adiar nossas vontades e impulsos.


Começamos a aprender sobre o convívio com o outro muito cedo, dentro de nossas famílias. Ainda bebês, somos obrigados a esperar cinco minutinhos pela mãe que está no banho quando precisamos mamar. Já crianças, ouvimos uma série de “nãos”, aprendemos a dividir o brinquedo com o irmão ou o amiguinho, aprendemos que não podemos bater no outro só porque ele nos desagradou. Ao longo de nosso crescimento, várias regras são internalizadas de tal forma que, quando chegamos à idade adulta, elas fazem parte de nós. Uma família mais severa tende a gerar membros mais rígidos, enquanto que famílias mais abertas tendem a formar pessoas mais flexíveis (embora isso seja uma tendência, e não uma regra).


Quando chega a época de nos relacionarmos, trazemos conosco um modo de ser diretamente influenciado por nossa família. A organização da casa, a rotina, os planos para o futuro e tantas outras coisas têm, mesmo sem que percebamos, influência de como fomos criados. E é justamente aí que as coisas se tornam ainda mais difíceis em termos de convívio com o outro. Se trazemos conosco tudo isso, a pessoa com quem nos relacionamos também traz a “bagagem” dela. Como cada família é uma família com hábitos e visões próprios, é natural haver certas divergências e conflitos no cotidiano de um casal. Um desses conflitos diz respeito ao lugar que a família de cada um tem na relação desse casal. Deixe-me explicar melhor.


Há famílias, digamos assim, mais “unidas”, em que os membros estão mais próximos em todos os sentidos. Ao olharmos para elas, podemos ter a impressão de que não há indivíduos, mas apenas um todo, um coletivo. É comum, nessas famílias, as pessoas formarem suas próprias famílias, mas permanecerem ao redor de um “núcleo central”. Geralmente continuam vivendo na mesma casa ou compartilham o mesmo quintal, de maneira que as vidas se entrelaçam no cotidiano. Às vezes os filhos até saem de casa e tornam-se fisicamente mais distantes, porém a distância é realmente apenas física, já que a família continua exercendo bastante influência na vida destes adultos.


Existem, em um outro extremo, famílias que prezam pela independência de seus membros. Conforme os filhos crescem, saem de casa e passam a viver suas próprias vidas, tomando suas decisões sozinhos ou com pouca participação da família de origem. Isso não significa que não haja amor ou que a família não seja unida. Há, isso sim, um apreço pela autonomia de cada um. E o que acontece quando uma pessoa que vem do primeiro tipo de família se relaciona com outra que vem de uma família do segundo tipo? Nesses casos, é comum haver divergências. Pelo que venho percebendo nas mensagens que recebo, esta é uma situação que tem se repetido bastante nos dias de hoje. Muitas mulheres, principalmente, se queixam de que seus pares são excessivamente ligados à família, não tomando decisões sem que a mãe ou o pai opinem. Essas mulheres consideram seus namorados excessivamente dependentes, como se não buscassem realmente uma relação afetiva, por estarem muito vinculados à suas famílias de origem. Muitas mulheres reclamam do fato de que não conseguem ter, com estes homens, uma vida independente, já que eles sempre atrelam a família a qualquer ocasião a dois. O que fazer diante de tal situação? Será viável uma relação entre pessoas que vêm de famílias tão diferentes?


Em primeiro lugar, é preciso ter em mente que não há um modo certo ou errado de uma família conviver. Geralmente tendemos a pensar que a nossa maneira é a única ou a mais correta, e acabamos criticando ou condenando o que é diferente do que estamos acostumados. Acontece, no entanto, que há apenas modos e arranjos diferentes entre as famílias, o que não significa que um seja melhor do que o outro. Por este motivo, quando as pessoas que nos escrevem mostram-se indignadas pela atitude, que consideram dependente em excesso, de seus pares, costumo responder que eles apenas têm uma maneira de lidar com a família que é diferente da maneira como estão acostumadas (e como elas próprias lidam com suas famílias). Isso significa, então, que uma pessoa deve simplesmente aceitar a interferência da família do outro na vida do casal, incluindo sogros, cunhados etc. em tudo o que o casal faz? De maneira alguma. O que fazer, então?


Lembra que eu disse, lá no começo, que conviver é um permanente exercício de flexibilidade e relativização? Pois é, na vida a dois esta é a mais pura verdade. Como eu mencionei, quando duas pessoas se unem, cada uma traz sua “bagagem” familiar. A vida do casal não será, contudo, a simples “soma” das duas “bagagens”. Cada casal construirá seu próprio modo de ser. Quando uma nova família se forma, ela não será a reprodução exata da família da esposa ou do marido. Será, isso sim, um terceiro tipo de família, que agregará os valores comuns aos dois. Por isso a flexibilidade é tão importante. O marido não imporá sua maneira de ver o mundo à esposa, e vice-versa. Cada um vai precisar ceder aqui e ali, se adaptar em uma coisa ou outra, abrir mão de coisas que perceberá que não são tão importantes assim. É evidente que há certos pontos fundamentais em que não pode haver flexibilidade. Não estou propondo, aqui, que ninguém se anule em prol do outro, de maneira alguma. Estou dizendo apenas que, para encontrar uma terceira maneira de conviver (diferente das duas famílias de origem), é preciso abrir mão de certas coisas em prol de outras. Como fazer isso, como chegar a esse denominador comum, esse equilíbrio tão necessário à vida a dois?


Para se chegar a esse denominador comum, é fundamental que ambos os membros do casal estejam dispostos a isso. Quando os dois têm visões diferentes sobre coisas básicas e ninguém, ou só um, se dispõe a ser flexível, a continuidade da relação está ameaçada. Quando as mulheres se queixam da dependência excessiva dos homens de suas famílias, é preciso saber o quanto eles estão dispostos a mudar, assim como se elas estão dispostas a tolerar os sogros um pouco mais. É preciso, portanto, chegar a um modo de agir que não seja exatamente o dele nem o dela. Se apenas um lado puder relativizar as coisas, de nada adianta.


Para se encontrar o tal denominador comum, é preciso não tentar impor ao outro, a qualquer custo, a sua visão, como se ela fosse a “certa” e a da outra pessoa estivesse “errada”. É preciso substituir a disputa por saber quem está certo pela conversa visando um denominador comum. Nos relacionamentos, não importa quem “ganha” ou quem “perde”, pois a simples disputa já leva os dois a perder.

Este artigo foi escrito por:

Dra. Mariana Santiago de Matos
Psicóloga

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