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quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Pernambucanas pobres usam cartões postais para questionar candidatos

Mulheres negras e pobres não têm voz, afirma Edclea Santos

Pernambucanas pobres usam cartões postais para questionar candidatos
"Assistente social trabalha no programa
"Eu Decido o Meu Voto"
A assistente social Edclea Santos tem uma ideia genericamente negativa dos políticos. Ela diz que somente de quatro em quatro anos eles prestam um mínimo de atenção para a sua vizinhança, localizada nos arredores de Olinda (Pernambuco). "Aí, chove candidato".

Com as eleições gerais do próximo dia 3, as últimas semanas viraram um verdadeiro dilúvio político. "Tem aqueles que só aparecem, prometem coisas, oferecem dinheiro às pessoas, pegam o seu voto e aí você nunca mais os vê de novo", diz Edclea.


Mas, neste ano, ela faz parte de um projeto que busca valorizar os votos das mulheres, que representam mais da metade do eleitorado brasileiro.


Várias organizações se uniram para ensinar as mulheres de algumas das partes mais pobres de Recife e Olinda a como tirar fotos, escolher os melhores ângulos e cortar as suas imagens.


As melhores fotografias foram transformadas em cartões postais a serem enviados a candidatos, questionando os seus pontos de vista sobre os mais variados assuntos, incluindo aborto, saúde, racismo, crime e violência doméstica.


As mulheres também receberam câmeras descartáveis para retratar o seu dia a dia.


A próxima fase da sua campanha, intitulada "Eu Decido o Meu Voto", ocorre na internet, com a publicação das respostas dos candidatos em um blog.


Elas também têm monitorado as opiniões dos candidatos no Twitter e checando as suas promessas.


"A ideia era provocar os candidatos a falar sobre assuntos femininos e, ao mesmo tempo, criar uma cultura junto às mulheres de cobrar mais dos candidatos em relação às suas próprias vidas", diz Nataly Queiroz, do Grupo Curumim, uma organização de defesa dos direitos da mulher que está fortemente engajada na campanha.


"As fotos são uma maneira das mulheres mostrarem elas mesmas as suas vidas, sem serem fotografadas por outras pessoas ou falando por meio de outros".


Vida de empregada


A pobreza e a desigualdade de renda são problemas que Edclea encontra frequentemente em seu trabalho. Ela também ajuda a administrar a sede da campanha, que fica na Comunidade do Passarinho.

Eunice trabalha desde os 12 como empregada doméstica. Foto: Emma Lynch/BBC
"Eunice trabalha desde os 12 como
empregada doméstica.
"A gente tem que tomar decisões próprias", diz Eunice do Monte

Edclea diz que o projeto "Eu Decido o Meu Voto" deu às mulheres uma chance de dizer o que elas querem sobre assuntos que lhes dizem respeito. "Os pobres não têm uma voz, especialmente as mulheres negras. Existe essa atitude de nos dizer para calar a boca, nos dizendo que não sabemos nada", afirma.


Duas ativistas do Grupo Curumim encarnam esta situação. Eunice do Monte, 67 anos, começou a trabalhar como empregada doméstica aos 12. "Eu chorava, chorava e implorava à minha mãe para me levar para casa, mas eu tinha que ficar. E foi o que eu fiz".


Eunice trabalhou em troca de comida e roupas até os 20 anos, quando então ela se deu conta de que tinha direitos - e isto a fez se associar ao sindicato das domésticas.


"Na época de eleição, o que não falta é candidato pedindo pelo seu voto, mandando cartas, fazendo telefonemas e insistindo. Esta campanha mostra que a gente tem que tomar decisões próprias", diz.


Com 20 anos, Patrícia Lima cresceu em um Brasil diferente de Eunice. Ela participa do Curumim desde os 13 e atualmente faz parte de um grupo local de teatro. No entanto, ela sabe muito bem como é a vida de empregada doméstica.


"A minha avó era empregada - ela começou aos 9 anos. Minha tia e minha mãe também eram. Se eu não tivesse me tornado ativa politicamente, eu provavelmente não teria realizado o meu sonho de ser atriz e teria virado doméstica também".


Na Comunidade do Passarinho, cerca de 15 mulheres se encontram em uma pequena sala na casa de Edclea enquanto crianças brincam e assistem à televisão no quarto ao lado.


Três máquinas de costuma ocupam uma parede inteira - o grupo realiza cursos para ensinar as mulheres a costurar. Elas fazem bolsas que serão vendidas para melhorar a renda.


"A nossa missão é fortalecer as mulheres em relação a seus direitos humanos, em relação a gênero e raça. Em sua maioria, as mulheres aqui são negras e sustentam as suas famílias", diz Edclea.


As mulheres dizem que a vida melhorou nos últimos anos. "Você agora pode entrar em uma casa modesta e encontrar uma televisão de tela plana, um computador. O padrão de vida das pessoas melhorou bastante", diz Edclea.
"Se eu não tivesse me tornado ativa politicamente, eu provavelmente não teria realizado o meu sonho de ser atriz", diz Patrícia. Foto: Emma Lynch/BBC
Se eu não tivesse me tornado ativa
politicamente, eu provavelmente não
teria realizado o meu sonho de ser atriz,
diz Patrícia.

Atriz Patrícia Lima participa do programa "Eu Decido o Meu Voto"

"Aqui as pessoas têm casas e saneamento, mas do outro lado do rio, tem pessoas vivendo em caixas de papelão. Elas não têm saneamento, água, e isto é um grande conflito. O que nós esperamos do próximo governo é que ele melhore a vida das pessoas que ganham muito pouco".


Seja qual for o resultado da eleição, Edclea acredita que a sua campanha fará os candidatos, especialmente os locais, notarem as suas exigências.


"Isto nos deu a chance de dizer o que queremos e, depois, de manter a pressão nos políticos depois que eles forem eleitos".

Fotos: Emma Lynch/BBC"

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