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quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Violência doméstica

Mesmo com a lei Maria da Penha, muitas mulheres ainda sofrem agressões




Mulheres e entidades dedicadas ao combate da violência doméstica têm o que comemorar: o ator Dado Dolabella foi condenado a dois anos e nove meses de prisão por agredir a atriz Luana Piovani e sua camareira, em outubro de 2008, durante a festa de estreia da peça "Pássaro da Noite", em uma boate da Zona Sul do Rio de Janeiro. Os advogados do ator vão recorrer da decisão da juíza Ane Cristine Scheele Santos, do 1º Juizado de Violência Doméstica Familia.

A sentença, vista como exagerada por alguns criminalistas, é resultado da Lei nº 11.340, conhecida como Maria da Penha e em vigor desde 2006, criada para amenizar dores de muitas mulheres e punir seus agressores. A Lei representou um avanço da legislação, mas, ainda assim, a violência permanece em muitos lares.
“Já procurei delegacias, delegacias da mulher e até o serviço social do Fórum, mas é como se eu não existisse. Nenhuma denúncia foi adiante. Na última audiência, no mês passado, meu ex chegou a me ameaçar e a admitir que bateu no nosso filho na frente do juiz. E nada aconteceu”
As pesquisas confirmam a gravidade do problema: a cada 15 segundos, uma mulher é agredida no país. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), de 2005, mostram que 29% das mulheres já foram violentadas física ou sexualmente no Brasil. Apesar disso, 25% deste total não contaram a ninguém o que houve. A pesquisa Ibope/Instituto Patrícia Galvão de 2006 revelou que 51% dos entrevistados souberam de casos de ataques a mulheres. Em 2007, o Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (Unifem) divulgou relatório que apontava que três de cada dez brasileiras com mais de 15 anos já sofreram violência física extrema.
As agressões são feitas de diversas maneiras: por armas, chutes, socos e ameaças de morte, por exemplo. E o que mais surpreende é que na maioria das vezes elas partem do cônjuge ou companheiro que divide ou dividia o mesmo teto e a mesma cama que as vítimas. Segundo a advogada e pesquisadora Valéria Pandjiarjian, sócia do Instituto Patrícia Galvão e membro do Comitê Latino-americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (Cladem), a raiz da violência contra a mulher está nas relações de poder. "É uma questão cultural. Nossa sociedade ainda é muito machista, patriarcal, e estabelece papéis diferenciados para cada gênero. Na intimidade, isso se potencializa, pois o âmbito familiar acaba sendo um 'território sem lei', ou com 'leis' próprias. De acordo com nossa herança social, a mulher é vista como propriedade do homem, então se ela foge do comportamento que é esperado dela, o homem pode usar a violência como forma de controle e castigo", esclarece Valéria, lembrando que há pouco tempo atrás até a legislação era discriminatória.
O crime afeta mulheres de praticamente todas as idades e em todas as camadas socioeconômicas do país, ainda que dados indiquem que a maioria das queixas tem origem em classes sociais mais baixas. O resultado dos ataques deixa cicatrizes não só no corpo. Uma pesquisa realizada pela Universidade Federal do Ceará, em 2005, afirma que a violência doméstica provoca depressão em 72% das mulheres. Tentativas de suicídio foram relatadas por 39% das 100 entrevistadas.
Atrás de justiça... e dos filhos
O caso da técnica de enfermagem Ana Paula de Melo, de 33 anos, é um dos que ainda não foram solucionados. Durante nove anos ela viveu com um advogado que a agredia e ameaçava. "No início, ele era muito carinhoso, mas aí começaram os ataques psicológicos. Ele me colocava para baixo, me deixava mal. Depois, descobri várias amantes. Até que ele partiu para as agressões físicas - numa delas, eu estava grávida e acabei perdendo o bebê", conta ela, que teve quatro filhos com o agressor. Após feri-la diversas vezes e chantageá-la para que saísse de casa, Ana Paula não agüentou mais e decidiu ir embora, deixando os filhos. "Em 2004, dois dias antes da audiência que decidiria a guarda, ele foi até a minha casa armado, de madrugada, e apontou um revólver para a minha cabeça. Assustada, concordei com a decisão de que ele ficasse com as crianças. O acordo, porém, não foi cumprido. Nunca tive livre acesso aos meus filhos. Hoje, o mais velho, de 11 anos, mora comigo porque foi expulso de casa pelo pai. Mas tem um ano que não vejo os outros", relata.
Em 2006, o ex-marido de Ana Paula a agrediu novamente e ela chegou a ir ao IML. Mesmo assim, o agressor está impune. Lutando pela guarda dos filhos, ela teve que suportar muitas injustiças. "O juiz manteve a guarda com o pai, ignorando o laudo da psicóloga que alegava que eu podia ficar com as crianças. O pai faz a cabeça dos filhos, que repetem o discurso dele. Sempre tento me aproximar deles, mas é muito difícil. Vou continuar correr atrás disso, nem que seja a última coisa que eu faça na vida", desabafa a mãe. Sobre as agressões, que não se restringiam apenas a Ana Paula, nada foi feito. "Já procurei delegacias, delegacias da mulher e até o serviço social do Fórum, mas é como se eu não existisse. Nenhuma denúncia foi adiante. Na última audiência, no mês passado, meu ex chegou a me ameaçar e a admitir que bateu no nosso filho na frente do juiz. E nada aconteceu", afirma.

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