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terça-feira, 25 de maio de 2010

Corrupção do país se reflete no futebol, diz autor de ‘freakonomics’ do esporte

'Soccernomics' usa análise de dados e matemática para entender futebol.
Simon Kuper diz ao G1 que Brasil seria hexa em Copa de pontos corridos.


As classificações brasileiras nos rankings mundiais de futebol e de corrupção são muito diferentes. Líder na lista da Fifa e vitorioso no esporte mais popular do país, o Brasil ocupa o 75º lugar sobre percepção de corrupção, segundo a organização não-governamental Transparência Internacional. Apesar do aparente contraste, no âmbito interno, a corrupção da sociedade invade o futebol, trazendo desconfiança e escândalos que podem ser percebidos na quantidade de reclamações a respeito das arbitragens e nas supostas "malas brancas" neste fim de Campeonato Brasileiro.

Esta análise faz parte do livro “Soccernomics”, que acaba de ser lançado em edição em inglês e que incorpora a análise de dados, a estatística, a matemática, a economia e até a sociologia para entender o futebol e como ele reflete as sociedades. Escrita por Simon Kuper e Stefan Szymanski, a obra está sendo considerada o equivalente do futebol ao “Freakonomics”, em referência ao Best-seller de Steven Levitt e Stephen J. Dubner, que expõem a economia excêntrica na vida cotidiana das pessoas. 


Em entrevista ao G1, por telefone desde Paris, Kuper explicou parte das análises contidas no livro, dizendo que a matemática indica que um cálculo entre população, riqueza e tradição fazem potências internacionais no esporte, que pode vir a ser dominado pelos EUA no futuro. Ele fez comentários a respeito da corrupção no futebol e no Brasil.

“Quanto mais corrupta a sociedade, mais corrupto o futebol. O esporte reflete a realidade do país”, disse. Segundo Kuper, a corrupção no futebol está presente especialmente em países mais pobres e em ligas menores. “Um jogo entre Manchester United e Real Madrid, por exemplo, dificilmente pode ser comprado, pois os interesses e os valores envolvidos são muito grandes, assim como o número de pessoas, então é mais raro ver corrupção ali. Mas em campeonatos menores, que envolvem menos dinheiro, isso pode acontecer.

Além disso, explicou, a própria economia interna também é um fator importante, pois quando um país tem juízes mal pagos, se torna mais fácil e barato corrompê-los. “Pagar bem ao árbitro ou trazer juízes de fora do país podem ser alternativas para evitar problemas de corrupção nos campeonatos.” O mesmo vale para os jogadores, com o oferecimento de mala branca e dinheiro para tentar influenciar os resultados. 
Futebol calculista
No livro, Kuper alega que a matemática comprova que quanto mais rico o país, melhor a média de vitórias da seleção dele, e que um bom técnico e muito dinheiro gasto em contratações costuma não fazer tanta diferença para um time. “Isso não funciona em todas as partidas, mas como regra há uma estatística que comprova. É uma regra. Descobrimos que o dinheiro gasto com a transferência de jogadores é menos relevante de que os salários pagos pelos clubes aos atletas. Quanto melhores os salários dos jogadores, melhor costuma ser a performance do clube.” 

Ampliar FotoFoto: Reprodução

Capa do livro Soccernomics, de Simon Kuper e Stefan Szymanski (Foto: Reprodução)

A maior parte dos dados usados no trabalho são relativos ao futebol europeu, em que o livro se debruça. A ideia deles foi levar para o esporte a abordagem que os Estado Unidos já têm em relação ao beisebol, mas Kuper admite que o trabalho nem sempre é bem aceito pelos torcedores. “Algumas pessoas ficam com raiva porque nos acham arrogantes. Em países como a Inglaterra, e imagino que o Brasil também, as pessoas pensam que sabem tudo sobre o futebol, e aí discordam do livro com base no que conhecem e dizem que estamos errados.”

O autor admite que as estatísticas podem ajudar numa previsão de longo prazo, mas que em uma partida qualquer coisa pode acontecer. “Os eventos do dia afetam todo o jogo, e tudo é possível. Mas em cem jogos, temos estatísticas que nos permitem prever o que vai acontecer. Há uma série de leis de estatísticas e probabilidades que podem ser aplicadas ao futebol.”

A imprevisibilidade de partidas isoladas, diz, se prolonga a torneios rápidos como Copas do Mundo, formato de poucos jogos que permite, matematicamente, que qualquer time ruim tenha chances de se tornar campeão. Um torneio de todos contra todos é muito mais previsível, e normalmente o melhor time, o mais bem admministrado, ganha. 

Kuper diz ser impossível prever quem vai ganhar a Copa de 2010, mas afirma que o Brasil seria hexa, se fosse um campeonato longo e de pontos corridos. “Diria que o Brasil tem boas chances, mas que não vou me surpreender se os Estados Unidos já conseguirem avançar até mesmo a uma final. Se fossem mais jogos, com todos os times se enfrentando, as chances do Brasil seriam muito maiores. As estatísticas mostram que o Brasil tem uma vantagem muito maior quando se incluem muitos jogos, seja em uma única sede ou em jogos de ida e volta.” 

Futebol brasileiro
Os resultados do Brasil, que venceu Omã em amistoso na terça-feira (17), parecem contradizer a matemática do “Soccernomics”. Sem ser tão rico quanto os países europeus, a estatística poderia negar a teoria de Kuper, que admite a exceção para comprovar a regra. “O Brasil conquistou mais que o esperado. É um país grande, que joga futebol há muito tempo, mas que não é rico e não tem uma renda per capita alta. O que o país conquistou no futebol é fantasticamente maior. É uma surpresa dentro das estatísticas.”

Analisando a realidade brasileira, Kuper diz que a única coisa que pode explicar isso é a popularidade do esporte, a seriedade com que todos levam o futebol mesmo em jogos recreativos. “Em um playground na Inglaterra e na Alemanha o futebol é muito ruim. No Brasil, as pessoas se esforçam e são boas em qualquer âmbito, é uma questão cultural que forma bons jogadores.”

Mas se o Brasil impressiona por ter os melhores jogadores do mundo há décadas, segundo ele, desde os anos 1970, entretanto, a Europa desenvolveu uma tática melhor. “Há anos o Brasil tenta desenvolver o melhor estilo, mas tem dificuldade em desenvolver o estilo europeu de futebol, que é mais coletivo e mais rápido. O Brasil ainda tem uma visão romântica do futebol, menos tática.”

Segundo o pesquisador, o Brasil vai continuar sendo competitivo no futuro do futebol internacional, mas novos países no esporte como EUA, Austrália, Turquia, nações que estão se desenvolvendo, estão aprendendo a tática européia e podem desenvolver isso junto com a riqueza da economia e o tamanho da população. “Os Estados Unidos estão crescendo dentro do esporte e vão se tornar uma ameaça para seleções como a brasileira.”

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